quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

Passe 2009 em sua própria companhia!!



Há muitos anos decidi escrever um livro sobre a felicidade. Seriam depoimentos de pessoas, conhecidas e desconhecidas, sobre essa sensação que os homens procuram inutilmente. Inutilmente, sim, porque a felicidade redentora mora na sensação do desejo não realizado. Depois de um tempo desisti de escrever o livro. Talvez por ter me dado conta de que a felicidade é uma ilusão e é apenas a sua possibilidade que nos mantém vivos. Ou seja, não desejar ser feliz é praticamente morrer em vida.

Eu estava pensando sobre isso no último domingo quando descobri, no meio da minha papelada, um texto sobre a felicidade, escrito pelo acadêmico Josué Montello, há muitos anos, especialmente para este livro que não vingou. Ele era gentil e carinhoso comigo e, entre as várias lembranças suas que guardo — além das madeleines proustianas que gostava de me oferecer no chá das quintas-feiras — era que ele dormia apenas três ou quatro horas por noite. Certa vez, chegando ao apartamento dele para mais uma conversa, encontrei-o com um curativo na testa. O que aconteceu com o senhor, perguntei? E ele, sorridente, explicou: "Sabe meu filho, a minha vida inteira dormi pouquíssimo, me sentia ótimo, mas agora os médicos decidiram que devo dormir mais. Me deram um remédio e não sei dizer o que aconteceu. Acho que dormi, bati a cabeça na janela e me encontraram no chão, desacordado, com este corte sangrando", contou Montello, jurando que nunca mais colocaria um comprimido para dormir na boca.

Mas voltemos ao texto que achei enfurnado na gaveta da minha escrivaninha. Entre outras coisas, Montello dizia que aos 15 anos, depois de ter visto sua irmã mais velha morrer de uma doença, descobriu que também era vítima do mesmo mal que a roubara do convívio da família à revelia de todos os tratamentos. Contou ainda que sua mãe lutou como uma leoa e, por conta disso, ele conseguiu sobreviver, consciente de que devia à vida a vontade firme com que ela lhe ensinou a superar suas limitações. "Sempre hei de ouvir, na experiência de meus desalentos ocasionais, o ruído de minha rede, indo e vindo, indo e vindo, enquanto redobrava minha confiança interior em mim próprio, agarrado à vida como um ato de vontade contínua. E aqui estou, já agora com a consciência de que não falhei nos objetivos que pretendia alcançar!", escreveu Montello. No texto que me enviou, o "professor" — dizia que quando precisava de consolo para algum contratempo, ia olhar o dia nascer do retângulo de sua janela. Era um homem religioso, tanto que finalizou o texto assim: "Deus, todas as manhãs, pinta uma aurora nova. Pinta e apaga. É preciso ter olhos para os quadros de Deus, se temos condições de admirálos. Mesmo nas manhãs nubladas".

Montello se referia às coisas mais importantes da vida, disfarçadas pela névoa da simplicidade. Aquelas coisas que realmente importam e das quais só nos lembramos quando alguma dor violenta nos desassossega. Acredito em sinais. E por acreditar neles tenho certeza que essa cartinha não caiu no meu colo às vésperas do Ano Novo por acaso. Estamos sempre tão ocupados para desfrutar os momentos sagrados da vida que nem nos damos conta de que eles existem. É nesses momentos, que parecem tempo perdido, que nos encontramos. Por isso, nesse Ano Novo não leia os jornais, não veja o noticiário, não queira estar atualizado, muito menos tente ser um vencedor. Seja você, no seu lugar de verdade. Pode ser até que você esteja usando uma roupa fora de moda, desfilando com um cabelo esquisito, ouvindo uma música que deixa os outros arrepiados, lendo um livro que as pessoas já esqueceram, falando palavras fora de moda como "janta", "capote" e "colega". Quem sabe prefira ficar em casa sozinho, como eu, vendo algum filme da coleção que você ganhou de uma amiga querida. Mas se for assim, que seja assim de verdade, para que você possa se reconhecer e iluminar sua alma. Porque é só nesse lugar que existimos plenamente. Um lugar onde ninguém pisa, onde só você pode entrar. Talvez quando estiver lá dentro, você pode até achar que não vale a pena, mas pare um pouco, observe e veja toda a beleza a sua volta. Nos primeiros minutos, talvez você ache que não vai encontrar nada de novo, não se reconheça, mas tenha certeza, alguma coisa muito importante está acontecendo.

Que em 2009 você encontre este lugar seguro e acolhedor. O seu lugar. Que pode até não ser tão bonito como você gostaria que fosse. Mas é seu. E o que é seu de verdade ninguém pode roubar. Feliz 2009!

Um comentário:

  1. Axo que não tem companhia melhor do que a nossa mesmo, vc tem toda razão.

    Lindi - RJ.

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